
Apesar da fama de bizarro e estranho, Rogério Skylab mostra-se bastante consciente quando o assunto é música. Fala sem pudores e sem medo de criar polêmica, assim como se expressa nas letras de suas músicas, que por sinal são regadas a muito humor negro e possuem um sentido escatológico. Você pode até achá-lo meio doentio, mas a verdade é que mesmo com esse seu jeito meio esquisito, vem conquistando a cada dia mais fãs e espaço na mídia. Como ele mesmo diz, vive silenciosamente num grande circo de horrores e, talvez seu diferencial seja transformá-lo em poesia cantada em suas canções aparentemente sem sentido, mas que se analisadas podem demonstrar uma total coerência. Seus shows são dotados de performances bastante curiosas, pois suas atitudes chegam a assustar a platéia, como por exemplo no momento em que ele puxa uma faca e ameaça os mais próximos! Apesar de não enquadrar-se em um estilo predeterminado , musicalmente assemelha-se às diversos gêneros como o Heavy Metal, o Punk e a Bossa nova, entre outros.
Lívia: Para começar, gostaria de saber o porquê do nome Skylab. O que significa?
A minha primeira música se chamava SAMBA DO SKYLAB e retratava a paranóia de uma época em que o laboratório espacial americano, de nome SKYLAB, poderia cair na cabeça de qualquer um. Acabou caindo em cima de uma vaca australiana. Eu inscrevi a canção num festival e tirei o primeiro lugar. A partir daí nunca mais parei de fazer música.
Lívia: Gostaria de saber quais as suas influências e em que estilo sua música se enquadra, e também que falasse um pouco de seu novo disco, o ‘’Skylab VI’’?
É difícil falar em influência e estilo. Acho inclusive que essas duas palavras são meio gastas. Uma grande obra, se merece esse nome, está em luta contra outras que já existem. Uma influência é algo passivo. Veja o meu caso: Chico Buarque é uma grande referência pra mim. No entanto, a minha relação com o Chico é de confronto. Não existe nada passivo entre eu e Chico. A relação é de porrada. Você vai chamar isso de "influência"? Estilo é outra palavra complicada pra mim, uma vez que eu tento abraçar vários estilos ao mesmo tempo. Prefiro me definir sem estilo nenhum. O SKYLAB VI é um disco de grandes contrastes. Eu procurei valorizar isso: ao lado do chulo, o transcendental. Esse talvez seja um conceito do disco.
Lívia: Como você começou na música? Foi no Setembro Negro?E até hoje, o que você consideraria como sendo a maior conquista de sua carreira?
Sim. Foi no SETEMBRO NEGRO. Uma banda punk como tantas outras da época. Já tocamos com CÓLERA, OLHO SECO, INOCENTES, ETIÓPIA... enfim... os punks eram o que o hip-hop é hoje. A conquista é a minha visibilidade. Sou conhecido nacionalmente em função do Programa do Jô.
Lívia: O que é Bizarro pra Rogério Skylab? E por um acaso já ocorreu algo bizarro em algum show seu?
Quer ver uma pessoa bizarra? O Dinho Ouro Preto. Já. Eu abri um show pro Paralamas - talvez o último show deles antes do acidente do Herbert. Isso já é em si uma situação bizarra. Não satisfeito, abri o meu show com a música URUBU. E não satisfeito ainda, abri minha braguilha e fiquei com o piru de fora. OBS: só durante a primeira canção.
Lívia: Como você reage às críticas feitas á sua pessoa e seu trabalho? Alguma vez você teve algum atrito com músicos ou com alguém que tenha sido alvo das críticas/ chacotas de sua música?
Um dia, um crítico que eu não vou mencionar o nome, falou assim: esse cara desafina mais do que Herbert Vianna sem tutano". Eu gostei tanto, mas eu gostei tanto, que transformei essa frase numa música: HERBERT VIANNA. E a música diz assim (é só isso a letra dela): "Eu desafino mais do que Herbert Vianna sem tutano". Eu fico repetindo essa frase uma porrada de vezes. Assim é a minha relação com os críticos. Ainda não tive esses atritos, graças a Deus. Mas tenho a impressão que um dia ainda vou ser preso.
Lívia: Você ouve bandas brasileiras?O que acha da MPB e do futuro musical no Brasil? E quanto á cena carioca?Acha promissora?O que você destacaria?
Vou te dizer uma coisa: eu não gosto do rock brasileiro. Ouço muito Frank Zappa - esse é o meu Deus. Quanto aos nacionais, ouço Arrigo Barnabé e Daminhão Experiença. Como você pode ver, estou bem longe do rock nacional. Olha... assim como nas artes plásticas, na poesia, na literatura, no cinema, enfim... o Rio de Janeiro sempre foi destaque nacional. Não poderia ser diferente no que se refere às bandas de rock. A gente ouve muito falar em Porto Alegre e Recife, mas os trabalhos mais interessantes que ouvi, vieram daqui do Rio mesmo. O problema daqui, é que falta uma política cultural capaz de dar visibilidade nacional ao que é produzido aqui. Por exemplo: não existe um festival de música representativo. Uma triste consequência de tudo isso, é que quando ocorre um festival em outro estado e procuram por bandas cariocas, são sempre as mesmas as escolhidas, como se o Rio de Janeiro só tivesse aquela meia dúzia de bandas.
Lívia: A Internet hoje é o meio de comunicação que mais cresce e liga as pessoas. Ela estreita os laços e diminui as distâncias físicas. Qual sua relação com ela? Como você se aproveita dela para a promoção de seu trabalho? Aproveitando, queria saber sua opinião sobre troca de arquivos gratuitamente, como mp3, por exemplo.
Primeiramente, INTERNET pra mim é tudo. Até sexo eu faço pela internet. Quanto à trocas de arquivos, MP3... bem, isso é uma faca de dois gumes para o artista independente. Ele deixa de ganhar dinheiro com a venda de cds mas passa a ser mais conhecido, mais divulgado. Com o tempo, acredito que vai se chegar a um meio termo. Por enquanto, a gente se encontra num torvelinho e não sabe que direção tomar. Eu te confesso que prefiro que comprem o meu cd...
Lívia: Como você compõe e onde busca inspiração? E é verdade que suas gravações são feitas ‘’ao vivo’’, com todos os instrumentos juntos?
Componho sem querer: dentro do ônibus, no trabalho, no chuveiro, de madrugada. Uma forma de compor absolutamente mental, livre de instrumentos musicais e anotações na pauta. Aliás, não é de hoje que a música contemporânea vem questionando a anotação (nesse sentido, John Cage é um pioneiro). Não sou a favor da intuição - essa é uma praga que assola o nosso país (nossos maravilhosos músicos são todos intuitivos). Mas isso não significa que eu esteja então no terreno da técnica - longe disso. Entre a técnica e a intuição, está o Conceito. É aí que eu me situo. Quanto às gravações, é verdade. Essa foi uma forma que eu encontrei. Acho que cada um tem que encontrar a sua forma. Eu precisava valorizar a dinâmica, tão importante no meu trabalho. E a gravação tradicional não valoriza muito.
Lívia: O Skylab faz parte de você, do seu cotidiano ou é apenas um personagem? Como é o seu convívio com familiares e amigos, principalmente colegas de trabalho? Eles não estranham esse se outro lado? E como você lida com os fãs?
Eu cada vez mais me convenço que não há diferença nenhuma entre o SKYLAB no palco e o Rogério no trabalho. Antigamente, eu procurava manter essa divisão. Hoje eu já superei isso e não tenho por que me dividir. Com os fãs, temos uma relação maravilhosa, de igual para igual, sem mistificações.
Lívia: Certa vez ouvi dizer que você era o Marilyn Manson brasileiro, tanto pelas atitudes, quanto pela aparência. Além disso, foi citado também que apesar do estilo, ambos são cultos e politizados. O que você diária sobre isso?
Olha, eu vou te dizer uma coisa. Eu gosto do Marilyn Manson, como gostava do Alice Cooper. No entanto, há uma grande diferença entre eles e eu: eles fazem o circo do horror (é a política do espetáculo); enquanto eu, vivo esse horror no meu dia a dia, silenciosamente. Acho que é essa a diferença.
Lívia: Para fechar, gostaria de agradecer pela entrevista e deixar o espaço livre pra qualquer manifestação sua.
Foram muitas perguntas. Acho que te dei uma idéia razoável do que penso. Mas vai sempre ficar faltando alguma coisa. E é sempre essa coisa que falta, a mais importante.
Um beijoRogério
Por Lívia Bueno
Fotos: Philipe Fernandes